quinta-feira, 23 de julho de 2009

Miriam e Tio Ary: um casal incomum.

Na entrada da casa, sobre a saia longa de seda indiana, um avental simples amarrado na cintura, ela nos aguardava na porta, com os olhos brilhantes de sempre.

Na mesa rústica, a toalha fina revelava o que viria para o jantar: um camarão de preguiçoso, com alho poró, pupunha e catupiry. Taças de vinho de cristal, os melhores pratos, cuidadosamente arrumados como se fosse uma festa. Mas era só um jantar para nos receber em sua encantadora casa. Um armazém antigo que virou lar, num misto de simplicidade e sofisticação que raras pessoas conseguem produzir.
Cortinas de crochê nas janelas da varanda, gatos passeando pela sala. E seis cachorros hospedados no canil, além dos outros de estimação que ficavam guardados perto da casa.

Brindamos com champanhe ao ano que tinha iniciado e continuamos com champagne no jantar. Conversas de família, quem morreu, casou, descasou, onde mora, o que faz. Tantas histórias para recordar que o tempo foi pouco para tudo.

Olhei tudo à minha volta sem acreditar em tanta ordem, bom gosto, calor humano, presença de vida em cada canto. Meu tio morreu quando começaram a reforma da casa (parte do plano de mudança de São Paulo para Florianópolis, onde viveriam o resto de vida com a paz do campo, as ondas do mar e o conforto da capital). Como este era o plano, ela decidiu terminar sozinha a reforma e mudou para lá. Como companhia, os cães. Depois levou seu pai, cuidou dele até o fim, agora vive com a irmã mais velha e dois sobrinhos. Formou uma nova família amorosa à sua volta e não perdeu o brilho dos olhos apesar de tudo.

A comida era ótima, a mesa linda, mas o que eu recebi mesmo naquela noite além do seu abraço forte na despedida, foi mais uma lição de como a vida se transforma todos os dias e cabe a nós fazer deste novo tempo uma oportunidade de dar e receber amor dos que nos cercam em cada fase da nossa vida.

E além desta receita de vida, ainda ganhei mais duas: o famoso Haddock do tio Ary e o Camarão Preguiçoso que comemos neste jantar tão especial.
Miriam querida, obrigada pela acolhida, pelo abraço e pelas receitas.
Você não sabia, nem eu, mas aquele foi o nosso último jantar em família.

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